COMENTÁRIO À CONFERÊNCIA DO PROF. EUGENIO RAÚL ZAFFARONI
VI Congresso Sociology of Law, Unilasalle, 24.09.2021
Agradecemos e parabenizamos ao Prof. Raúl Zaffaroni por nos proporcionar uma belíssima, contextualizada e inspiradora conferencia. Suas palavras descortina horizontes para, não só pensar o momento presente de excepcionalidade , de crises civilizatória, ética, institucional, ecosocial, mas, sobretudo, de uma profunda crise acerca das condições sanitárias e da própria saúde humana. Esta crise da saúde social humana, acompanhada de uma crise do meio-ambiente, não está desconectada do mundo globalizado sem fronteiras e fundado na perversidade do neoliberalismo, das novas formas assumidas pelo capitalismo – em sua face financeira, digital e vigilante – de uma realidade monopolizada por incertezas, pós-verdades e, como diz Zaffaroni, “ linchamentos mediáticos”, dos novos processos de “colonialismo genocida”, arrastando consigo violências, ódios, irracionalismos, intolerâncias, a par do fosso abissal , aprofundando, cada vez mais crescentes desigualdades sociais, sofrimento, miséria e injustiça. Estamos paralisados e incapacitados pela turbulência destruidora e desumanizadora desta civilização de racionalidade neoliberal, o que nos impõe, urgentemente, para o presente, pensar e agir, para redefinir os horizontes e buscar alternativas em defesa da Vida. Como desenvolver e quais os instrumentos que podem ser capazes de transpor o momento presente para um cenário futuro pós-covid-19, ativando práticas e resistências, mais compromissadas, evocando Boaventura de S. Santos, com o “justo, solidário e sustentável”.
Quais as ferramentas capazes de potencializar as resistência e as emancipações diante da inoperância, paralisia, degradação e falência dos aparatos institucionais, quer seja Estado, Democracia, Republicanismo, Partidos e o próprio Direito. Este, tradicionalmente, um “campo de luta” (nas palavras de Zaffaroni) e compromissado com o poder sob o manto falacioso da neutralidade. Mas, não é com o formalismo jurídico casuístico, impuro, sujeto de manipulação, que se poderá contar. Logo, problematizar ,discutir e ressignificar o uso emancipador do direito, é sempre um desafio, principalmente em tempos de crescente exclusão, discriminação, homofobias, devastação de privacidade, desastres climáticos e da derrocada sanitária.
O vírus em suas diferentes espécies, lugares e épocas distintas tem servido e utilizado em nível mundial (na América, África e Ásia), sendo retomado hoje, como expõe Zaffaroni, por um “colonialismo tardio”, revelando a crueza e a desumanização em diferentes espaços sociais, marcando a vitimização de coletivos sociais e a sonegação de prestação igualitária às múltiplas subjetividades identitárias. Refletir Direitos, e particularmente, Direitos Humanos, nesse contexto de desastres climáticos, extinção do mundo animal, deslocamentos humanos e da mais grave crise mundial da saúde humana, força também trazer e discutir a interseccionalidade de classes, gênero, raça, identidades, e minorias vulneráveis em suas diversidades e diferenças. Pautar e privilegiar um Direito Humano à saúde, é reconhecer e reivindicar o acesso à saúde, alimentação, moradia, educação, segurança, e políticas públicas eficazes. Assim, pauta-se por Direitos Humanos não somente como categoria de análise ou instrumental teórico-prático, mas, sobretudo, como um conjunto de ações, processos para mobilizar e transformar a realidade social, função que contrapõe-se a omissão e a falta de cuidado com a saúde em sua dimensão coletiva frente à mercantilização da Vida. É a ruptura com a lógica individualista e mercantilista. Dai o esforço de ressignificar e reordenar as nossas estratégias, voltadas para uma vida com mais solidariedade, com mais dignidade. Os Direitos Humanos em sua dimensão humana em harmonia com a natureza pode e deve ser um potente instrumento de luta e resistência. Não podemos desistir diante do caos politico-social e do flagelo pandêmico, mas, acreditar na militância humanizadora, apostar na construção coletiva , sem perder a força, a coragem e a esperança de que “outro mundo é possível”. E, trazendo o ideário zapatista: “un mundo donde quepan muchos mundos’ (um mundo onde caibam muitos mundos).
Muchas Gracias, amigo Raul Zaffaroni, por este privilegio de estar en su compañia y de ser una fuente permanente de inspiración para nosotros.
Muito obrigado a todos e a todas !
Prof. Dr. Antonio Carlos Wolkmer
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